quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Luar com pimenta

Uma flor às vezes vem com espinhos. Ela tinha dentes afiados, insuspeitáveis por trás dos seus lábios grossos. Não sei se vingava um amor fracassado ou se queria apenas me mostrar a força selvagem do seu desejo. Anestesiado pelas caipirinhas, recebi sua crueldade como uma tempero a mais. A doçura viria depois, quando a lua e eu, de improviso, fomos o abrigo da sua fragilidade. Mas a lua é mulher e tem memória fraca. Eu é que não esqueço tão cedo o calor surpreendente daquele corpo, o suave cheiro de mato e a menina acanhada que vislumbrei entre seus olhares ríspidos. Enquanto não tenho nenhum dos três, contento-me com a cicatriz que ela me deixou na boca, e o desejo mudo de merecer novamente a crueldade sôfrega dos seus dentes afiados.

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