domingo, 20 de dezembro de 2009

Onde estão minhas fadas?




A vida é amarga, mas não é amarga como um bom café. Ela é chata, pequena, mesquinha. Depois dos dezesseis anos todo sonho já vem com o carimbo de Sonho Impossível. Mas eu sou teimosa: eu sonhei assim mesmo. Eu quis enxergar um charme especial naquele cabelo grisalho,  não apenas o sinal de que ele mentia a idade. Acreditei que a ex-mulher de Petrópolis era uma megera que só se preocupava com academia e botox. Depois ainda vislumbrei um amor paternal na forma como ele falava da cocker spaniel. Sonhei que aquele carinho e aquela dedicação um dia seriam para mim. No hotel em Cabo Frio, eu chupei como uma profissional, eu abri as pernas em cima da mesa, depois ainda fiquei me perguntando se eu tinha sido perfeita. Ah, como eu queria acreditar que eu tinha sido perfeita! Quando as flores começaram a chegar, eu pensei: “Até que não foi tão difícil. A proposta e o anel vêm depois”. Ainda havia nos meus olhos cansados, um resquício de comédia romântica que me fazia pensar em anel, em dança de salão, em palavras de filmes antigos. Naquela manhã constrangedora, ele disse que seu único vício era o café, e eu quis acreditar também nessa bobagem. Os filmes não me ensinaram dos outros vícios, da capacidade para mentir, do desprezo inabalável que um homem pode sentir, mesmo depois de dois anos na mesma cama. Isso eu tive de aprender aos tropeços, entre um riso fingido e uma manhã de ressaca, um orgasmo fingido e um telefone mudo. Mas eu sou teimosa: eu vou sonhar assim mesmo! Vou acreditar que ele temia me perder para alguém mais jovem, que ele gaguejava quando falava minha idade para os amigos — talvez escondesse os famosos comprimidos azuis no bolso interno do paletó. Semana que vem já vou olhar aquelas fotos com outros olhos. Vou me deixar convencer pelo meu próprio riso falso, e jurar para qualquer amiga que eu fui feliz. E esse choro irritante de hoje, esse silêncio, que não me deixa perguntar onde errei, vai ser só mais uma lembrança indigesta, como o sêmen que engoli em Cabo Frio. Quando outro homem falar em cocker spaniel, quando eu vir outra gravata de seda e outro anular sem aliança, os meus olhos vão estar prontos para mais poesia, e a minha boca, para mais de sêmen. Porque eu sou teimosa, eu vou sonhar com tanta força que a realidade vai acabar se parecendo com minha fantasia, nem que seja por piedade.