Ele ficou chocado quando fez a descoberta. Estava na cama, o corpo nu recebia uma brisa suave de maio. A namorada tinha ido ao banheiro, não gostava de ficar com sêmen entre as pernas. Quando voltou, deitou a cabeça sobre o peito dele, disse as palavras carinhosas que costumava dizer nessas horas. Falou sobre casamento, sobre a felicidade de ter encontrado a pessoa certa. Ele se perguntava se devia lhe contar a novidade — a coisa acabava de se revelar, clara e serena como um reflexo de lua. Mas sua namorada era muito bonita, ele temia perdê-la. E o pior é que ela se culparia por tudo. Buscaria o motivo nalguma parte do seu corpo, na barriga, nas mínimas estrias, na cor do cabelo — talvez no estranho cheiro de rosas queimadas que ela exalava principalmente depois do sexo. Ela era mulher, não podia evitar o prazer misterioso da culpa. E por isso mesmo ele resolveu se calar. Não queria correr o risco de torná-la infeliz como uma divorciada. Se nunca mais pensasse no assunto, talvez a revelação passasse despercebida. Talvez desistisse de se mostrar, e bateria em outra porta, como essas pessoas que vêm pedir para campanhas de caridade. E, de fato, protegido pela rotina, Paulo conseguiu esquecer o assunto. Sua namorada não percebeu, e ele nunca disse a ela, nem a ninguém, que não gostava de sexo.
Esse miniconto foi publicado na Cult de outubro de 2011, na seção Oficina Literária. Fiquei sabendo graças ao Clêiton, que me avisou aqui pelo blogue. Muito obrigado, Clêiton. A revista não me mandou nem um email. Se não fosse você eu não teria visto a publicação do meu próprio texto.
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