A mulher quis uma mesa no segundo andar porque achou que estaria mais calmo. Na verdade estava mais agitado. No verão, todos preferiam o segundo andar porque as sacadas deixavam o ambiente mais fresco. Para o homem não fazia diferença, desde que o lugar não tivesse televisão. Não gostava de comer ao som das notícias trágicas de um telejornal, ou dos diálogos vulgares de uma novela.
Assim que se acomodaram, o garçom se aproximou e lhes entregou o cardápio. O homem quase não acreditou no que lia. Mostrou à esposa, que também ficou intrigada. Mas, quando perguntaram ao garçom, ele confirmou o que ambos haviam lido. Explicou que a casa tinha mudado de dono, e o menu fora renovando recentemente.
— É até meio cômico — disse o homem, um pouco desconsertado. Depois se voltou para a mulher, com uma cara interrogativa, como se perguntasse: “E agora, o que pediremos?” Ela suspirou, e leu o menu novamente. Na seção de pratos havia apenas três opções:
1. O Melhor
2. O Médio
3. O Pior
Logo abaixo vinha a sugestão do chef: “O Melhor”.
Sem pensar muito, a mulher levantou os olhos e respondeu:
— Vamos pedir o Médio.
O marido, ainda indeciso, fez uma pequena objeção.
— Você não prefere experimentar o Melhor?
— Amor, não vamos arriscar. A casa mudou de dono, não sabemos como está a cozinha. Vamos pedir o Médio, outro dia pedimos o Melhor.
O homem acabou por concordar. Pediram um Médio para dois.
Na mesa ao lado, outro casal acabava de se acomodar. Agora era a mulher que estranhava o cardápio, e o mostrava ao marido, indagando se não seria algum tipo de brincadeira. O homem também estranhou, e perguntou se ela queria tentar outro restaurante. A mulher alegou que isso já seria exagero. Não queria passar pela vergonha de se levantar e sair da mesa, diante de todos. Por fim, conformou-se à situação, e disse ao marido para pedir o Médio. Erguendo o cardápio, ele expressou uma ligeira contrariedade:
— Amor, o Pior está com um preço razoável. Hoje não é nenhuma comemoração, por que não pedimos o Pior?
— Querido, você está falando sério? — Ela se sentia mal em ter de explicar algo tão óbvio.
— Se fosse para pedir o Pior, eu ficava em casa e esquentava o almoço. Se saímos de casa, vamos pedir pelo menos o Médio.
O marido concordou. Não era todo dia que comiam fora.
E todos iam chegando e encontrando algum motivo para pedir o Médio. Não queriam o Pior, mas, por alguma razão, não se sentiam dignos do Melhor. Não era tanto pelo preço, era a audácia daquele nome, que para alguns soava exagerado, para outros, até repulsivo. O Médio sempre acabava parecendo a melhor opção.
Mas um homem que chegou mais tarde, também acompanhado, pareceu não se importar com esse protocolo. Depois de manusear rapidamente o cardápio, pediu o Melhor. O garçom, acostumado a ouvir outra coisa, não compreendeu de imediato. Reclinou-se ligeiramente e perguntou:
— Como disse, senhor?
O homem repetiu claramente — O Melhor, por favor — e como falasse um pouco mais alto, foi ouvido nas mesas mais próximas.
O garçom anotou o pedido vagarosamente, depois acrescentou num tom ligeiramente teatral: — Perfeitamente, senhor. Temos o Melhor — como se quisesse se fazer ouvir também nas outras mesas. Em seguida se voltou para a mulher, e perguntou delicadamente:
— E para a senhora?
Ela sorriu, quase não logrando controlar o nervosismo. Olhava para seu companheiro, tentando lhe transmitir a dificuldade que enfrentava. O homem, parecendo não perceber o problema, perguntou com naturalidade:
— Você não vai querer o Melhor?
Visivelmente constrangida, a mulher não sabia o que responder. Queria recusar o Melhor, mas não diante do garçom. Seu desespero aumentou quando percebeu que as pessoas das mesas mais próximas estavam atentas ao que dizia. Seus olhares oblíquos pareciam ansiar que ela pedisse o Médio, e desse fim àquela hesitação.
— Vou querer o Médio! — ela disse bruscamente, olhando severa para o parceiro. Depois, como se precisasse se justificar, acrescentou: — Não estou com apetite para o Melhor. Talvez outro dia.
O garçom, mais aliviado, despediu-se com tranqüilidade — Pois não, senhora. O Médio, perfeitamente — e se dirigiu à cozinha.
A mulher ficou olhando de soslaio para o homem, como se tentasse lhe transmitir que ele cometera uma grave indelicadeza. Pedira o Melhor para si, e a deixara a cargo do Médio. Isso não era justo com ela, que procurava fazer de tudo para lhe agradar. Tinha certeza que devia repreendê-lo, para que o erro não se repetisse, mas não sabia como abordar o assunto.
Enquanto ela pensava, certa ansiedade aumentava nas pessoas em redor. Todos estavam um tanto indignados com o atrevimento daquele homem, mas não sabiam exatamente o que comentar. Pressentiam que não seriam justos se o criticassem apenas por ter pedido o Melhor. Afinal, era um prato previsto no cardápio.
De repente os olhos da mulher faiscaram de júbilo, pois ela encontrou finalmente uma saída. Dirigindo-se ao parceiro, com o nariz ligeiramente erguido, começou o ataque.
— Não precisava ter falado tão alto. As pessoas ouviram.
— Não falei “tão” alto. Falei apenas um pouco mais alto. O garçom não estava me entendendo.
— Você sabe que falou mais alto. Não precisava disso. Você quer mostrar a todos que prefere o Melhor?
O homem percebeu que havia alguma coisa errada.
— Do que você está falando? Não quero mostrar nada a ninguém.
— É mesmo? Pelo tom que você usou, me pareceu outra coisa.
Ele se calou por um instante, e olhou atentamente para a parceira. Não eram casados. Havia pouco tempo que estavam saindo. Começou a pensar que talvez não fosse a mulher certa para ele.
Nas outras mesas, o homem ia se tornando o assunto principal. As mulheres o censuravam gravemente, pois não achavam de bom tom pedir o Melhor, muito menos daquela forma, fazendo que todos ouvissem. Os homens concordavam prontamente com suas esposas — sim, ele cometera uma indelicadeza, sem dúvida — mas alguns pensavam intimamente em voltar sozinhos ao restaurante, justamente para experimentar o Melhor. Não cometeriam o erro de o pedir explicitamente, apenas o indicariam com o dedo, e o garçom compreenderia a necessidade de discrição. Ficaram felizes por pensar numa solução tão engenhosa. Eram, sem dúvida, homens de uma astúcia fora do comum, e agora acreditavam realmente merecer o Melhor. E quanto mais se satisfaziam com essa conclusão, mais concordavam com suas mulheres: — Sim, que homem indelicado, o Médio basta para qualquer um...
Na cozinha se passava uma inquietação ainda maior. O gerente estava sabendo do acontecido, e fora se certificar com o cozinheiro. Estava tenso e um pouco angustiado, não sabia exatamente como se expressar.
— Então, um cliente pediu o Melhor, não foi?
— Sim, já estou sabendo — disse o cozinheiro, tranquilamente.
— Você sabe como fazer?
— Sei, sim. Fiz esse prato muitas vezes no curso de gastronomia.
O gerente não se sentiu muito bem com essa resposta. Achou que o homem não precisava fazer lembrar que havia feito um curso superior.
— Olha, eu sei que você tem um diploma, não precisa falar disso o tempo todo.
— Não estou falando disso, apenas respondi sua pergunta.
— Você está me entendendo errado — o gerente resolveu usar de sua grande complacência. — Não estou questionando sua capacidade. Apenas achei que... bem, como o prato não é muito pedido, talvez você não lembrasse como fazer.
— Obrigado pela consideração, mas sei como fazer. Não se preocupe.
O cozinheiro agia com tranqüilidade, e já tinha começado a preparar o prato. O gerente ficou perambulando pela cozinha, fingiu verificar os ingredientes, abriu o armário, arrumou alguma coisa no escorredor, depois se voltou abruptamente para o colega, e desabafou:
— Olha, se você quiser, podemos dizer que hoje não temos o Melhor. Podemos inventar que falta algum ingrediente, sei lá. Não precisa se matar para fazer o Melhor. Sei como seu trabalho é duro, não vá se esgoelar para satisfazer um almofadinha.
O cozinheiro não entendeu bem a razão daquela proposta. Mas, de fato, o Melhor dava mais trabalho, e, se o próprio gerente estava dizendo que não precisava fazê-lo, talvez ele devesse desistir. Ficou algum tempo pensando nessa possibilidade, mas também especulou que aquilo podia ser um teste de confiança. Talvez o gerente quisesse medir o quanto ele estava disposto a se dedicar ao trabalho. Depois de hesitar alguns segundos, ele falou, ainda desconfiado: — De fato, acho que não temos alcachofras.
Mas calhou que o gerente tinha acabado de ver as alcachofras no armário e, por reflexo, respondeu: — Elas estão ali!
Houve um breve constrangimento. Nenhum deles sabia o que dizer, até que o gerente abriu um largo sorriso, e anunciou: — Já sei! Vamos dizer que estamos apenas com um estagiário na cozinha, e ele ainda não sabe fazer o Melhor.
O cozinheiro a princípio concordou, mas de repente percebeu que a idéia não lhe era favorável. Se alguém descobrisse a farsa, a culpa recairia toda sobre ele, pois aquela justificativa não comprometia em nada os outros empregados. De súbito segurou seu superior pelo braço, e lhe pediu que esperasse. O gerente o olhou com enorme reprovação. Sem saber o que fazer, o cozinheiro despistou, cabisbaixo: — Diga... diga apenas que vai demorar. O Melhor demora mais para fazer, não é tão fácil quanto o Médio.
O homem aprumou o paletó, olhou com certo desprezo para o cozinheiro e concordou com um aceno de cabeça. Subiu as escadas para dar a notícia ao cliente. Quando chegou à mesa, notou que a mulher não estava. Obviamente não fez comentário sobre isso, apenas justificou a demora do prato. O cliente pareceu não se importar, e aproveitou para pedir um aperitivo.
Enquanto isso sua parceira tinha ido ao banheiro e fazia uma ligação pelo celular. Ela ainda não tinha formado uma idéia precisa sobre o que estava acontecendo, e sentiu a necessidade urgente de consultar uma amiga. Do outro lado da linha, uma voz atendeu sonolenta. A mulher explicou demoradamente a situação. Descreveu em detalhes o restaurante e o homem com quem estava, depois finalmente tomou coragem para contar o momento mais humilhante.
Enquanto isso sua parceira tinha ido ao banheiro e fazia uma ligação pelo celular. Ela ainda não tinha formado uma idéia precisa sobre o que estava acontecendo, e sentiu a necessidade urgente de consultar uma amiga. Do outro lado da linha, uma voz atendeu sonolenta. A mulher explicou demoradamente a situação. Descreveu em detalhes o restaurante e o homem com quem estava, depois finalmente tomou coragem para contar o momento mais humilhante.
— Aí ele fechou o cardápio, pediu o Melhor para ele e o Médio para mim! Fez isso com a maior naturalidade, como se eu simplesmente não merecesse o Melhor!
— Não é possível! Você está falando sério, querida?
— Nunca falei tão sério, amiga! Dá para acreditar? Eu, que já tolerei oito anos de casada, nunca pensei que voltaria a passar por essas coisas!
— Mas ele pediu mesmo o Melhor para ele e o Médio para você? Assim, sem mais nem menos?
— Ai, amiga, o pior não foi isso! O pior é que ele falou em voz alta, praticamente gritou: 'O Melhor para mim, e o Médio para ela!' Não acreditei! Até agora não acredito. Por que isso está acontecendo logo comigo?!
— Olha, querida, você vai me desculpar, mas sabe o que está parecendo?
— Ai, pode falar, amiga. A essa altura, já posso ouvir qualquer coisa. Pode ser totalmente sincera, estou preparada.
— Eu ia dizer que está até parecendo que ele é... é... você sabe: um arrogante! Eu não queria falar, mas você mesma disse para eu ser sincera.
— O quê!? Ah, meu Deus! Eu estava suspeitando, amiga, mas não queria ir tão longe. Você acha mesmo?
— Sem dúvida! Qualquer homem deixaria você escolher. Ele não apenas pediu o Melhor para ele, mas ainda fez questão de decidir por você! Isso é sério, acho que você sabe perfeitamente que isso é arrogância.
— Sei, amiga, claro que sei! Ah, meu Deus, o que eu vou fazer?! Olha, acho que essa é a última noite que saímos juntos. Ele me parecia um cara tão legal, tão educado... mas agora, isso?! Não sei se posso tolerar.
— Eu entendo, querida, eu entendo. Já passei por situações parecidas. Olha, não quero te desanimar, mas homens assim querem ser tratados como reis. Não têm humildade nenhuma, sentem-se como se o mundo lhes pertencesse. Deus me livre! Se eu fosse você, pelo menos dava um tempo.
Agora ela estava arrependida. Queria desabafar com alguém, mas não pretendia ir tão longe. Sabia que o homem era gentil e não passara dos limites outras vezes. Seria precipitado terminar com ele.
— Pois é, amiga. Vou pensar. Realmente, já fui casada por oito anos. Não quero ter que agüentar outro capitão, ha, ha, ha! — Ela riu, tentando suavizar as acusações que acabava de fazer.
A amiga concordou sem acréscimos, e deu a entender que precisava se deitar por causa de um compromisso no dia seguinte. Na verdade não tinha compromisso nenhum, apenas ficara desapontada ao perceber, pelo tom da mulher, que nada iria acontecer. No máximo em dois dias ela já teria esquecido aquela noite.
E, de fato, ela a teria esquecido em dois minutos, não fossem os olhares atentos dos garçons quando ela voltava para o segundo andar. A mulher sentiu que eles a examinavam meticulosamente, e no íntimo deviam estar pensando que o homem que pedira o Melhor não fora tão exigente na hora de escolher uma namorada. Um dos empregados não se contentou em apenas considerar essa idéia, mas sentiu que um pensamento tão sagaz precisava ser comunicado a alguém. Correu para a cozinha e foi logo dizendo ao cozinheiro:
— Sabe esse homem que pediu o melhor?
— Sim.
— A mulher que está com ele nem é assim tão bonita...
— É mesmo?
— Parece que ele não quis o melhor na hora de escolher a mulher! Ha, ha, ha!
— Hum... sei, sei como é.
— E tem mais! Ele nem está bem vestido. Eu conheço aquela camisa de uma loja de departamento. Não é cara. Eu poderia comprar uma, se quisesse. Não compro, você sabe por quê.
— Por quê?
— Ora, como assim, por quê? Você sabe perfeitamente. Não quero ficar esbanjando por aí. Eu tenho bom senso!
— Ah, sim, foi o que pensei.
O garçom viu que não estava fazendo muito sucesso, e ficou um pouco envergonhado. Mas não queria sair dali sem falar no que realmente lhe importava. Aproximou-se do cozinheiro, tocou de leve seu ombro, e disse com gravidade:
— Olha, você não vai fazer o Melhor, vai? O gerente mesmo disse que não precisa se esforçar. Basta fazer o Médio, e pôr umas alcaparras assim por cima. Pronto! O homem não vai notar a diferença, pode ficar despreocupado. E veja bem: não sou eu quem está dizendo, o próprio gerente falou isso, pode confiar.
O cozinheiro não suportava mais a situação.
— Tudo bem, tudo bem! Não vou fazer o Melhor, vou fazer o Médio e coloco umas alcaparras por cima, está bem assim? Umas alcaparras e pronto! Afinal, ninguém vai perceber...
— Eu sabia, eu sabia! Você é dos nossos, sabia que você não iria nos decepcionar. — Sua alegria era sincera. — Vou dar uma subida, ver se alguém está querendo alguma coisa. Já volto para buscar o Médio com alcaparras. Vou falar com o gerente, tenho certeza que ele vai adorar a notícia.
E depois, com tapinhas nas costas, acrescentou: — Eu sabia, meu jovem. Sabia que podíamos contar com você.
O garçom deixou a cozinha, e o jovem se viu finalmente sozinho. Respirou, deixou cair os ombros, sentiu-se estranhamente derrotado. Não compreendia a razão de tanto alvoroço, sabia apenas que estava jogando fora sua primeira oportunidade de fazer o Melhor. E com tanta contrariedade, talvez fosse a última. No curso de gastronomia, não o haviam preparado aquela situação: fazer o Melhor não era apenas uma questão técnica; era preciso estar disposto a enfrentar a reprovação de todos. Estava prestes a se valer das alcaparras, e entregar mesmo o Médio como se fosse o Melhor. Mas alguma coisa dentro dele se recusava a acatar aquela decisão. Entre estar de acordo com todos e consigo mesmo às vezes é difícil decidir. Por isso, ainda desorientado, ele abriu a lata de alcachofras, pegou um dos corações, e o colocou sobre um prato vazio. Sem saber direito o que fazia, perguntou:
— E então? Você é uma alcachofra. Você é parte deste problema. O que tem a dizer?
— Feche a porta. Não precisamos de testemunhas — cochichou a alcachofra.
Só então ele notou que a porta que dava para o corredor estava aberta. Não se sentiu louco ou infeliz por poder ouvir uma alcachofra, mas extremamente grato. Era sem dúvida um poder bem interessante para um cozinheiro. Fechou rapidamente a porta, e se voltou, ansioso, para ouvi-la. Quase não acreditou no que ela disse:
— Não me olhe assim. Não espere muita coisa de mim. Você sabe que a decisão é inteiramente sua.
Ele nunca havia conhecido uma alcachofra tão lúcida. Sentiu que era alguém em quem podia confiar.
— Mas e o gerente? Ele não vai me demitir, se eu fizer o Melhor?
— Não exagere. Ele vai demorar no máximo uma semana para esquecer o assunto. Além do mais, você sabe que para ele não faz diferença, desde que o cliente pague a conta.
A alcachofra tinha toda a razão, e agora o cozinheiro estava mais seguro que nunca. Ele intuía que, depois que fizesse o Melhor, pisaria na cozinha de forma diferente. Cada vez que abrisse uma lata, cada vez que acendesse o forno, cada vez que cortasse uma verdura e o cheiro fresco lhe excitasse as narinas, ele saberia merecer aquela cozinha, como os lobos merecem a noite e os pássaros merecem a generosidade do vento. Com essa convicção serena, ele foi ao fríser, pegou os cogumelos marinados, baixou o forno e picou o estragão. Antes de completar, voltou-se para a alcachofra, e foi sincero com ela, como ela tinha sido com ele.
— Tomei minha decisão. Vou ter que parti-la em duas.
— Meu amigo, acredite: desde que entrei naquela vidro de óleo de girassol, não tenho esperado por outra coisa.
Ele acenou com a cabeça, ficou contente por ser chamado de amigo naquele momento crucial. Cortou a alcachofra com o coração tranqüilo e feliz. Em poucos minutos, chamou o garçom e anunciou: — O Melhor está pronto.
O empregado, terrivelmente contrariado, não ousou fazer sequer um comentário. Percebeu imediatamente que estava diante de um poder maior e mais estável que o dele próprio. Pegou o Melhor, pegou o Médio, que já estava pronto, e os levou ao segundo andar. Passou o resto da noite em silêncio. Mesmo que quisesse dizer alguma coisa, não saberia se expressar.
O homem era generoso e compôs uma garfada para a mulher. Depois de mastigar rapidamente, ela declarou: — Amor, é quase igual ao Médio.
Ele provou o Médio e objetou: — Não tem comparação, é muito diferente.
Ela fez questão de enfatizar: — É praticamente igual!
Vendo que não havia solução, o homem fingiu concordar, enquanto intimamente decidia terminar com aquela mulher. Não havia afinidade entre os dois, e ele intuía que isso não ia resultar num casamento feliz. No mesmo momento a mulher pensava que não lamentaria se aquele homem deixasse de procurá-la. Ele parecia realmente acreditar na diferença entre o melhor e o médio, e isso não podia ser um bom sinal. Não contaram esses pensamentos um ao outro, mas foi de fato a última vez que se viram.
Na cozinha, o jovem chef nem imaginava a separação que tinha causado. Mas estava mais seguro que nunca de saber a diferença entre o melhor e o médio. Uma diferença que agora estaria inscrita na sua própria história de vida, para sempre.
Eis um texto que quase merece o rótulo de "auto-ajuda". Eu disse um quase e acrescento a ênfase. Tenho certeza de que Paulo Coelho ou Augusto Cury jamais escreveriam algo tão ácido e delicioso. Um texto que até tem uma lição de vida (a de que as pessoas não suportam quem quer o melhor), mas antes disso nos brinda com um ritmo fluido e absolutamente perfeito. E justamente falando de seu humor ácido, e de alcaparras, me lembrei de uma piada que me contaram ontem: "se a vida lhe parece muito azeda, ponha pinga e açúcar".
ResponderExcluirAlto nível, gostei demais. Devia estar em destaque em nossos jornais e revistas tão médios. Abraço !
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